quarta-feira, 1 de junho de 2016

Herança em números - Míriam Leitão


- O Globo

Os dados da recessão estão escancarados. Ontem, saiu o desemprego. Em dois anos, 4,3 milhões de brasileiros perderam o trabalho, mais de dois milhões caíram na informalidade e o rendimento encolheu. Houve queda nos contribuintes para a previdência, o que agravou o rombo das contas públicas. O BC divulgou que até abril o déficit nominal foi de 10% do PIB. Hoje, o IBGE divulgará um PIB negativo.

Os dados do desemprego e do déficit são de abril, último mês que Dilma Rousseff governou o país antes de ser afastada. Essa é a sua herança. É desta espiral descendente que temos que sair, mas está difícil porque a queda da economia foi muito profunda.

A Pnad Contínua trimestral é o mapa mais amplo do mercado de trabalho em todo o país. A taxa de desocupação saltou de 10,9% no trimestre encerrado em março para 11,2% no trimestre até abril. Isso significa 11,41 milhões de brasileiros procurando emprego sem encontrar. O aumento foi de 62% sobre os 7,04 milhões de dois anos antes.


Hoje, o IBGE divulga o PIB do primeiro trimestre. As projeções dos economistas são de número negativo. Desde o começo de 2014 este será o sétimo trimestre de queda do PIB. Na comparação com o último período do ano passado, o número deve ficar negativo, em torno de 0,7% e 0,8%. Em relação a 2015, a retração pode passar de 6%. As projeções indicam mais números negativos até o final de 2016, confirmando uma previsão da FGV de 11 trimestres de recessão, a mais longa da nossa história.

O desemprego não é o único sinal de piora do mercado de trabalho. Há outros. Em dois anos, cerca de 2,2 milhões de pessoas foram empurrados para a informalidade. Continuaram trabalhando, mas perderam direitos trabalhistas. Ainda houve queda na renda real de 3,8% entre os que se mantiveram ocupados. Entre os que contribuem para a previdência, a perda foi de 609 mil em um ano. Isso agravou o rombo nas contas públicas. Ontem o BC divulgou que nos 12 meses até abril o déficit nominal do país ficou em 10%.

O número de empregados domésticos estava em queda, porque esses trabalhadores estavam migrando para outro emprego. Voltou a crescer 4% em um ano. O número dos que trabalhavam por conta própria aumentou 4,9%, equivalente a 1 milhão de pessoas. Os trabalhadores da indústria encolheram 11,8% e perderam 2,6% da renda.

Olhando para frente, o que preocupa é que o mercado de trabalho sofre sempre os efeitos retardados dos ciclos econômicos. Para o bem e para o mal. Foi isso que favoreceu a presidente Dilma Rousseff, em 2014, no ano eleitoral. Apesar de a economia estar estagnada, o mercado de trabalho ainda se manteve aquecido, com taxas de desemprego em torno de 6%. A partir de 2015, com a reeleição de Dilma e a rápida perda de confiança em sua gestão, o índice enfrentou uma deterioração rápida até chegar a 11,2% em abril.

O problema é que agora vai acontecer exatamente o efeito contrário: só depois que o PIB estiver em franca recuperação é que o desemprego vai começar a cair. A esperança é que o desemprego pare de subir no fim deste ano com algum alívio na economia, como a queda da inflação, aumento da confiança, e, provavelmente, redução da taxa de juros. Mas para voltar a crescer a oferta de emprego será necessário recuperar a confiança dos empresários e dos consumidores.

O economista Sérgio Vale, da MB Associados, avalia que o desemprego ainda vai subir a 13,5%, para ter uma ligeira queda no final do ano. Daí para frente, os cenários são mais incertos, como quase tudo na economia atualmente, porque dependem do fim do impasse político.

— Com Temer no poder, o desemprego pode cair e voltar a um dígito no ano que vem, porque haverá crescimento do PIB. Já se Dilma voltar à Presidência, projetamos uma retração de 2,5% no PIB de 2017, o que poderia levar o desemprego a uma taxa de 17% — afirmou.

O mercado financeiro avalia com preocupação a perda de capital político do governo Temer nestes 20 dias de gestão. Dois ministros já caíram. O dólar subiu 5% este mês, bateu em R$ 3,61 ontem. A economia foi atingida pelos erros econômicos de Dilma e, agora, pela incerteza política do país.

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