FOLHA DE SP - 29/05
Quem se lembrar do que estava fazendo na manhã de 11 de março poderá entender melhor as conversas do doutor Sérgio Machado com os magnatas de Brasília. Era uma sexta-feira. No domingo, 3,6 milhões de brasileiros iriam às ruas pedindo a saída de Dilma e festejando o juiz Sergio Moro.
Enquanto acontecia a maior manifestação popular da história do país, algumas dúzias de maganos, quatro deles grampeados, armavam esquemas para "delimitar" a Lava Jato. Nas longas conversas com Sérgio Machado, Dilma deveria ir embora para que se pudesse construir um "acordão". Segundo Romero Jucá, "tem que mudar o governo para estancar essa sangria". Costuravam fantasias de palhaço para quem fosse para a rua com bonecos ou cartazes saudando o juiz Sergio Moro.
Nenhum dos notáveis grampeados foi capaz de dizer que as ladroeiras deveriam ser investigadas.
Pelo contrário. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi chamado de "mau caráter" por Renan. Deixando-se de lado as referências de Machado à mãe do procurador-geral, Jucá chamou o juiz Moro de "torre de Londres", para onde se "mandava o coitado para confessar". Segundo Sarney, ele persegue "por besteira".
Na véspera do primeiro grampo, num jantar em Brasília, Renan expusera as vantagens do "semipresidencialismo", uma arapuca tucana onde prenderam o pé do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Para a turma do grampo, o desastroso governo petista deveria ir embora, levando consigo o alcance da Lava Jato.
Naqueles dias eram dois os países. No das conversas de Brasília, armava-se o "acordão". No das ruas, selou-se o destino de Dilma Rousseff. Falta apenas que o Senado baixe a lâmina.
Quem foi para a rua tem todos os motivos para se sentir atendido. Os grampos de Sérgio Machado mostram que, por motivos opostos, Renan, Sarney e Jucá também foram atendidos. Jucá tornou-se ministro.
Como a Lava Jato não foi estancada, Machado tornou-se um grampo ambulante, agravando o pesadelo da oligarquia ferida pela mesma Lava Jato.
VACINA
Michel Temer dispõe de uma vacina capaz de imunizá-lo contra a radioatividade da Lava Jato.
Trata-se de seguir a fórmula que livrou o companheiro Obama de muitas maluquices da maioria republicana no Congresso.
Basta o presidente interino comunicar à maioria parlamentar pluripartidária assustada com com a operação: "Não aprovem nada que comprometa as atividades do Ministério Público e do Judiciário. Se aprovarem, eu veto".
BAIXARIA
Floriano Peixoto deixou o palácio do Catete e não deu posse a Prudente de Moraes. O general Figueiredo fez a mesma coisa em 1985 com José Sarney. Apesar da diferença de rituais, nenhum dos dois cometeu a grosseria de Dilma Rousseff com Michel Temer.
O vice-presidente encontrou apenas uma funcionária no seu gabinete. Até as secretárias foram levadas para o Alvorada. Ficou só uma jovem, que dias depois se foi.
Felizmente o PT poupou o novo governo do constrangimento imposto por assessores de Carlos Lacerda à equipe de seu sucessor, Negrão de Lima, em 1966. Em uma gaveta do palácio Guanabara havia cocô.
MADAME NATASHA
Madame Natasha diverte-se com o vocabulário dos políticos.
Durante o mandarinato de Dilma Rousseff identificava-se um petista de fé porque ele dizia (e diz) "presidenta".
Michel Temer ainda não completou um mês na cadeira e identificam-se as pessoas que têm poder (ou acham que têm), porque elas se referem ao "Michel". "Temer" é coisa para pobre.
BAFO DO DRAGÃO
É impossível impedir que alguns maganos saiam por aí dizendo que conversam com ministro do Supremo Tribunal Federal.
Duas bolas já bateram na trave, mas nada impede que um ministro se distraia, caindo na frigideira.
JANTAR
Na semana passada o presidente Michel Temer jantou com os três comandantes militares e o chefe do seu gabinete de Segurança Institucional, general Sérgio Etchegoyen.
BILHETERIA VIP
Pode ter parecido estranho que Vandenbergue Machado tenha aparecido numa conversas do senador Renan Calheiros. Afinal, ele trabalha na Confederação Brasileira de Futebol.
O cidadão, poderoso representante de Ricardo Teixeira, que não pode pisar nos Estados Unidos, e de José Maria Marin, que está preso em Nova York, era o anjo da guarda dos poderosos de Brasília sempre que eles precisavam de ingressos (grátis) para eventos esportivos.
NA MOSCA
Sérgio Machado sabe das coisas. Conversando com Renan Calheiros, fez uma comentário escatológico sobre o Supremo Tribunal Federal e previu: "Com essa mulher vai ser pior ainda".
Acertou. Em setembro, a ministra Cármen Lúcia assumirá a presidência do tribunal, com a faca nos dentes.
BOA MEMÓRIA
O ex-senador e ex-presidente José Sarney disse que "está implantada" a "ditadura da Justiça", que "é a pior de todas".
É um homem justo. A outra, que durou de 1964 a 1985, não lhe fez mal algum.
Na ditadura dos generais, a namorada do ex-governador paulista Adhemar de Barros tinha um cofre com mais de US$ 2 milhões. Boa parte vinha de empreiteiros. A organização em que militava Dilma Rousseff levou-o.
A ditadura que combatia a subversão torturando presos orgulhava-se de combater a corrupção. A namorada de Adhemar disse que o cofre estava vazio, os generais acreditaram e ninguém incomodou os financiadores da famosa "caixinha do Adhemar". Os empreiteiros eram gente de confiança.
Sérgio Machado e o duque de Caxias
Alguém precisa explicar ao doutor Sérgio Machado que o duque de Caxias nunca ajudou a resolver problemas de quadrilhas de larápios.
Conversando com Renan Calheiros, o ex-senador e ex-presidente da Transpetro expôs um dos braços de seu plano para sedar a Lava Jato. Nas suas palavras:
"Fazer um pacto de Caxias, vamos passar uma borracha no Brasil e vamos daqui para a frente".
Depois, na conversa com José Sarney, Machado prosseguiu em sua vivandagem:
"Fazer um grande acordo com o Supremo etc. e fazer a bala de Caxias para o país não explodir. E todo mundo fazer acordo porque (...) não sobra ninguém".
O doutor confundiu o papel de Caxias enfrentando rebeliões políticas durante o Império com seu imaginário da proteção contra a Lava Jato. Caxias sufocou três grandes revoltas e articulou a anistia dos Farrapos do Rio Grande do Sul. A ideia de que ele pudesse passar a borracha numa encrenca como a de hoje é apenas um sonho das vivandeiras do século 21.
Pelo contrário, por motivos políticos, Caxias prendeu um ex-governante do país. Em 1842, depois de sufocar uma rebelião paulista, deteve o padre Diogo Feijó, que fora o regente do Império de 1835 a 1837. O padre, grande figura de sua época, a respeito de cuja honorabilidade jamais se disse uma palavra, escreveu-lhe: "Quem diria que, em qualquer tempo, o sr. Luís Alves de Lima seria obrigado a combater o padre Feijó? Tais são as coisas deste mundo..."
Caxias respondeu-lhe: "Quando pensaria eu, em algum tempo, que teria de usar da força para chamar à ordem o sr. Diogo Antônio Feijó?"
Quem se lembrar do que estava fazendo na manhã de 11 de março poderá entender melhor as conversas do doutor Sérgio Machado com os magnatas de Brasília. Era uma sexta-feira. No domingo, 3,6 milhões de brasileiros iriam às ruas pedindo a saída de Dilma e festejando o juiz Sergio Moro.
Enquanto acontecia a maior manifestação popular da história do país, algumas dúzias de maganos, quatro deles grampeados, armavam esquemas para "delimitar" a Lava Jato. Nas longas conversas com Sérgio Machado, Dilma deveria ir embora para que se pudesse construir um "acordão". Segundo Romero Jucá, "tem que mudar o governo para estancar essa sangria". Costuravam fantasias de palhaço para quem fosse para a rua com bonecos ou cartazes saudando o juiz Sergio Moro.
Nenhum dos notáveis grampeados foi capaz de dizer que as ladroeiras deveriam ser investigadas.
Pelo contrário. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, foi chamado de "mau caráter" por Renan. Deixando-se de lado as referências de Machado à mãe do procurador-geral, Jucá chamou o juiz Moro de "torre de Londres", para onde se "mandava o coitado para confessar". Segundo Sarney, ele persegue "por besteira".
Na véspera do primeiro grampo, num jantar em Brasília, Renan expusera as vantagens do "semipresidencialismo", uma arapuca tucana onde prenderam o pé do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Para a turma do grampo, o desastroso governo petista deveria ir embora, levando consigo o alcance da Lava Jato.
Naqueles dias eram dois os países. No das conversas de Brasília, armava-se o "acordão". No das ruas, selou-se o destino de Dilma Rousseff. Falta apenas que o Senado baixe a lâmina.
Quem foi para a rua tem todos os motivos para se sentir atendido. Os grampos de Sérgio Machado mostram que, por motivos opostos, Renan, Sarney e Jucá também foram atendidos. Jucá tornou-se ministro.
Como a Lava Jato não foi estancada, Machado tornou-se um grampo ambulante, agravando o pesadelo da oligarquia ferida pela mesma Lava Jato.
VACINA
Michel Temer dispõe de uma vacina capaz de imunizá-lo contra a radioatividade da Lava Jato.
Trata-se de seguir a fórmula que livrou o companheiro Obama de muitas maluquices da maioria republicana no Congresso.
Basta o presidente interino comunicar à maioria parlamentar pluripartidária assustada com com a operação: "Não aprovem nada que comprometa as atividades do Ministério Público e do Judiciário. Se aprovarem, eu veto".
BAIXARIA
Floriano Peixoto deixou o palácio do Catete e não deu posse a Prudente de Moraes. O general Figueiredo fez a mesma coisa em 1985 com José Sarney. Apesar da diferença de rituais, nenhum dos dois cometeu a grosseria de Dilma Rousseff com Michel Temer.
O vice-presidente encontrou apenas uma funcionária no seu gabinete. Até as secretárias foram levadas para o Alvorada. Ficou só uma jovem, que dias depois se foi.
Felizmente o PT poupou o novo governo do constrangimento imposto por assessores de Carlos Lacerda à equipe de seu sucessor, Negrão de Lima, em 1966. Em uma gaveta do palácio Guanabara havia cocô.
MADAME NATASHA
Madame Natasha diverte-se com o vocabulário dos políticos.
Durante o mandarinato de Dilma Rousseff identificava-se um petista de fé porque ele dizia (e diz) "presidenta".
Michel Temer ainda não completou um mês na cadeira e identificam-se as pessoas que têm poder (ou acham que têm), porque elas se referem ao "Michel". "Temer" é coisa para pobre.
BAFO DO DRAGÃO
É impossível impedir que alguns maganos saiam por aí dizendo que conversam com ministro do Supremo Tribunal Federal.
Duas bolas já bateram na trave, mas nada impede que um ministro se distraia, caindo na frigideira.
JANTAR
Na semana passada o presidente Michel Temer jantou com os três comandantes militares e o chefe do seu gabinete de Segurança Institucional, general Sérgio Etchegoyen.
BILHETERIA VIP
Pode ter parecido estranho que Vandenbergue Machado tenha aparecido numa conversas do senador Renan Calheiros. Afinal, ele trabalha na Confederação Brasileira de Futebol.
O cidadão, poderoso representante de Ricardo Teixeira, que não pode pisar nos Estados Unidos, e de José Maria Marin, que está preso em Nova York, era o anjo da guarda dos poderosos de Brasília sempre que eles precisavam de ingressos (grátis) para eventos esportivos.
NA MOSCA
Sérgio Machado sabe das coisas. Conversando com Renan Calheiros, fez uma comentário escatológico sobre o Supremo Tribunal Federal e previu: "Com essa mulher vai ser pior ainda".
Acertou. Em setembro, a ministra Cármen Lúcia assumirá a presidência do tribunal, com a faca nos dentes.
BOA MEMÓRIA
O ex-senador e ex-presidente José Sarney disse que "está implantada" a "ditadura da Justiça", que "é a pior de todas".
É um homem justo. A outra, que durou de 1964 a 1985, não lhe fez mal algum.
Na ditadura dos generais, a namorada do ex-governador paulista Adhemar de Barros tinha um cofre com mais de US$ 2 milhões. Boa parte vinha de empreiteiros. A organização em que militava Dilma Rousseff levou-o.
A ditadura que combatia a subversão torturando presos orgulhava-se de combater a corrupção. A namorada de Adhemar disse que o cofre estava vazio, os generais acreditaram e ninguém incomodou os financiadores da famosa "caixinha do Adhemar". Os empreiteiros eram gente de confiança.
Sérgio Machado e o duque de Caxias
Alguém precisa explicar ao doutor Sérgio Machado que o duque de Caxias nunca ajudou a resolver problemas de quadrilhas de larápios.
Conversando com Renan Calheiros, o ex-senador e ex-presidente da Transpetro expôs um dos braços de seu plano para sedar a Lava Jato. Nas suas palavras:
"Fazer um pacto de Caxias, vamos passar uma borracha no Brasil e vamos daqui para a frente".
Depois, na conversa com José Sarney, Machado prosseguiu em sua vivandagem:
"Fazer um grande acordo com o Supremo etc. e fazer a bala de Caxias para o país não explodir. E todo mundo fazer acordo porque (...) não sobra ninguém".
O doutor confundiu o papel de Caxias enfrentando rebeliões políticas durante o Império com seu imaginário da proteção contra a Lava Jato. Caxias sufocou três grandes revoltas e articulou a anistia dos Farrapos do Rio Grande do Sul. A ideia de que ele pudesse passar a borracha numa encrenca como a de hoje é apenas um sonho das vivandeiras do século 21.
Pelo contrário, por motivos políticos, Caxias prendeu um ex-governante do país. Em 1842, depois de sufocar uma rebelião paulista, deteve o padre Diogo Feijó, que fora o regente do Império de 1835 a 1837. O padre, grande figura de sua época, a respeito de cuja honorabilidade jamais se disse uma palavra, escreveu-lhe: "Quem diria que, em qualquer tempo, o sr. Luís Alves de Lima seria obrigado a combater o padre Feijó? Tais são as coisas deste mundo..."
Caxias respondeu-lhe: "Quando pensaria eu, em algum tempo, que teria de usar da força para chamar à ordem o sr. Diogo Antônio Feijó?"
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