quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Marco Antonio Villa comenta “A Década Perdida” em entrevista exclusiva

Marco Antonio Villa comenta “A Década Perdida” em entrevista exclusiva

Historiador acaba de lançar o livro, uma aprofundada pesquisa sobre os dez anos do PT no poder.
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Mestre em Sociologia e Doutor em História Social, títulos obtidos pela Universidade de São Paulo, Marco Antonio Villa desponta como um dos principais pensadores contemporâneos do Brasil graças à consistência e ousadia de suas pesquisas.
Professor da UFSCar, uma das maiores instituições federais do Ensino Superior, ele não abre mão da análise crítica sobre o próprio Governo. Prefere, conforme suas próprias palavras em “Década Perdida: Dez Anos de PT no Poder”, livro em que perfila fatos e padrões das passagens de Lula e Dilma pelo Palácio do Planalto, ser um “homem público”, e não um “político profissional”.
Vox conversou com Villa a respeito de sua recente obra e de alguns acontecimentos significativos dos últimos anos, como a atuação do PSDB como oposição e os protestos de 2013.
O resultado deste bate-papo está disponível abaixo.
Vox – Em 2005, logo após a crise do “Mensalão” ser deflagrada, o PSDB decidiu “deixar o PT sangrar até morrer”. Alguns analistas interpretam a estratégia como a mais desastrada dos últimos anos, porque permitiu a recuperação e a consolidação de Lula. Outros vaticinam que o PSDB foi prudente porque o impeachment arruinaria a economia brasileira. O país sobreviveria a um impeachment àquela época? Qual o custo político da decisão tucana?
Marco Antonio Villa - Sobreviveria. E estaria – estamos no terreno das hipóteses – melhor do que hoje. O isolamento petista era grande. O partido estava rachado. O apoio popular era desprezível (passeatas convocadas fracassaram) e as pesquisas mostravam um governo muito mal avaliado. A economia caminhava a passos de tartaruga. Ainda se tivesse crescendo a 10% ao ano… Faltou uma análise correta da conjuntura. E disposição para a luta política. Ter recuado significou dar um gás que foi vital para o renascimento de Lula, mais forte e, principalmente, livre da liderança histórica do PT.
A prática do aparelhamento petista de órgãos públicos é bastante explorada em sua pesquisa. Você tem vivência acadêmica na UFSCar, uma das principais marcas do ensino público brasileiro. A Educação foi envolvida neste esquema de aparelhamento?
Foi indireta através da ação do MEC. O panfletarismo foi a marca petista na educação. Além, claro, da incompetência. A expansão sem critério das universidades federais vai deixar um legado trágico aos futuros administradores. Ao invés de universidades (com cursos esvaziados e nível baixo) era necessário enfrentar o primeiro degrau da educação, o analfabetismo. Depois (ou de forma concomitante), o ensino fundamental, que não é diretamente responsabilidade da União, mas que poderia ter recebido verbas em grande escala e apoio gerencial. Mas o governo petista, na hora da escolha, sempre optou pelo mais fácil, mais conveniente e que poderia gerar dividendos políticos e eleitorais.
Você atribui ao Brasil um baixo nível de consciência política. Nos últimos dez anos, notamos a criação da Play TV, a distribuição de passaportes diplomáticos e o uso comercial do nome do presidente, praticado por Rosemary Noronha. Todos esses casos envolvem diretamente o poder público em fins mais pessoais do que políticos. Os integrantes do governo também possuem um baixo nível de consciência política ou eles agem assim intencionalmente?
Umas das marcas do governo foi a corrupção. Mas faltou uma ação incisiva da oposição para “colar” esta marca no governo. A oposição sempre está fora do campo aguardando o momento de ser chamada a entrar no jogo. Mas como não quer jogar, finge que não vê as solicitações para que faça o seu papel. No fundo, a oposição não gosta de ser oposição.
O governo Lula é mais corrupto que o governo de Fernando Collor? Marcos Valério atua como uma espécie de PC Farias do PT?
A estrutura petista é muito mais eficiente e perigosa para o país do que o esquema alagoano de saquear o Estado. E os volumes movimentados são “n” vezes maiores. O mais importante foi montar um projeto de poder que parece eterno.
Você defende, no livro, que os dez anos de PT no poder são marcados pela hipocrisia. Que a ideologia saiu de cena, a corrupção passou a ser parte do poder. A militância que vai às ruas e grita palavras de ordem contra a imprensa e a direita não nota isso ou prefere ignorar?
A militância é cada vez menor e está ligada ao poder direta (empregada no aparelho de Estado ou nas empresas e bancos estatais) ou indiretamente (via ONGs que recebem fortunas sem ter de prestar contas ao Erário). Esta militância é fanatizada e, claro, está preocupada com seu próprio bolso. Sabe que se o PT sair do poder, eles vão perder dinheiro.
Os protestos realizados em 2013 simbolizam o renascimento da consciência política?
Sim e não. Foi importante pois sinalizou que aquele mundo pintado pelo PT foi entendido que era fantasia. E que os brasileiros estavam satisfeitíssimos com o governo não passou de uma balela. Contudo, ficou como um outono político – quase inverno – sem que chegássemos ao verão da democracia. A ação dos black blocs acabou servindo ao governo pois afastou os manifestantes das ruas. Mas é inegável o desgaste do governo (e não só o da União, vide o caso Sérgio Cabral).
Em abril de 2007, você questionou, em artigo na Folha de São Paulo: “Será que no país do herói sem nenhum caráter também temos a oposição macunaímica?”. Passados quase sete anos e uma nova derrota, a de 2010, o PSDB deixou de ser “macunaímico”?
Infelizmente não. O Brasil é um país estranho. Nos países democráticos, os partidos estão correndo atrás dos eleitores. Aqui é o inverso. Há uma angústia por encontrar uma alternativa real de poder.
Pesquisa Datafolha divulgada em outubro de 2013 apontou o Brasil como um país majoritariamente direitista. 48% da população, segundo o instituto, tende a essa visão. A mesma pesquisa cita que 39% dos brasileiros que se declaram de direita votariam em Dilma Rousseff. Somente a falta de oposição explica essa dissonância ideológica?
Existe um enorme espaço para um partido liberal no sentido clássico. Só que este espaço dificilmente será preenchido. A elite política brasileira é conservadora e não liberal. Quer ter um naco de poder para usufruí-lo. Tanto que optou por apoiar o PT no Parlamento ao invés de tentar vencê-lo na eleição presidencial. Para o PT também acabou sendo um bom negócio. Assim, o país virou uma geleia geral ideológica.
Você recebe críticas ou algum tipo de resistência do meio acadêmico, geralmente ligado à esquerda, por se posicionar de maneira crítica em relação ao PT?
Críticas são sempre bem-vindas. O problema é quando chega ao terreno da desqualificação e do ataque pessoal. Os petistas fanatizados são uma espécie de camisas negras do fascismo italiano. E na internet esta tropa (financiada com dinheiro público) está presente e mais ainda em 2014, ano eleitoral.
Só o PT tira o PT do poder?
O PT sairá do poder quando o eleitor disser basta. Pode ser em 2014. Basta um pouco de disposição de luta da oposição. E vontade de enfrentar a máquina petista de destruir reputações e de ameaçar os defensores da democracia

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