terça-feira, 29 de outubro de 2013

NÃO DEIXEM DE LER O ARTIGO DE GENETON MORAES NETO SOBRE ROBERTO CARLOS , A CENSURA E A LIBERDADE DE IMPRENSA

Roberto Carlos: certíssimo e erradíssimo (ou: ao contrário do que diz RC, biógrafo não é nem jamais será “dono da história” do biografado…)

seg, 28/10/13
por Geneton Moraes Neto |
categoria Entrevistas

Roberto Carlos: certíssimo ao querer lançar uma autobiografia. Por que não?
Roberto Carlos: erradíssimo ao dizer que um biógrafo “passa a ser dono da história” do biografado.
E erradíssimo mil vezes ao fazer o papel de polícia da ditadura e mandar recolher um livro que não traz uma linha, uma palavra, uma sílaba sequer de calúnia, injúria ou difamação. Já se disse mil vezes, mas não custa repetir: triste, triste, triste.
O “x” da questão é este: pobre do país em que a lei permite que um trabalho jornalístico correto e embasado possa ser censurado, recolhido, trancafiado num galpão ou simplesmente incinerado. Prévia ou não, o que aconteceu ali foi censura. Não há outra palavra: censura, censura, censura – algo abominável numa democracia. Já que tantos argumentos são repetidos, não custa repisar esta palavra: abominável, abominável, abominável.
A declaração de Roberto Carlos ao Fantástico deste domingo traz um equívoco espetacular:
“O biógrafo também pesquisa uma história que está feita pelo biografado. Não cria uma história. Faz um trabalho e narra aquela história que não é dele – é do biografado. A partir do que escreve, ele passa a ser dono da história. Isso não é certo. Isso, na minha opinião, não é justo”.
Fecha aspas.
Neste caso, Roberto Carlos parece achar que apenas as autobiografias devem ser publicadas. O lançamento de biografias de personagens da música, cinema, política, esporte – ou seja o que for – não seria “justo” ou “certo”, porque os biógrafos, na visão equivocada de RC, passariam a ser donos das histórias dos biografados….
Ora, biógrafos não são “donos da história” de ninguém! São narradores e, na grandessíssima maioria dos casos, competentes e responsáveis. O papel que eles cumprem é importante para a cultura brasileira. Ou será que biógrafos que escreveram sobre Nélson Rodrigues (Ruy Castro) , Assis Chateaubriand (Fernando Morais) , Getúlio Vargas (Lyra Neto), Carlos Marighella (Mário Magalhães ) e o próprio Roberto Carlos ( Paulo César de Araújo ), para ficar apenas nestes notórios exemplos brasileiros, seriam reles usurpadores de histórias alheias? Não são. Nunca foram. Jamais seriam. É desrespeitoso se referir a eles como se fossem piratas.
É óbvio que o biógrafo contará sempre a história de outra pessoa – o biografado. Caso contrário, estaria fazendo uma autobiografia. Desde quando o biógrafo “passa a ser dono da história”?
Se, ao fazer aquela declaração sobre a natureza das biógrafos, Roberto Carlos na verdade estava se referindo a dinheiro, então ele estará reduzindo tudo – a produção de biografias, a prática do jornalismo, a história de um país, a crônica de uma época – a uma questão puramente mercantil. É uma visão igualmente triste, triste, triste. Há aspectos comerciais envolvidos? Há, é claro. Mas não é tudo.
Feitas as contas, repito: o que vai ficar de Roberto Carlos é a música, boa ou má, que ele produziu ao longo desse tempo. “Roberto Carlos em ritmo de aventura” – por exemplo – é produto pop de primeira. O que fica, então, é o que ele criou: não é este festival de atitudes equivocadas sobre biografias. Mas nunca é tarde para corrigir uma derrapada feia.
(Por fim: ao contrário do que possa parecer, não penso – jamais pensei – em escrever biografia de quem quer que seja. Não falo, portanto, em “causa própria”. Nem de longe. Sou um mero entrevistador. Fico no jogo de pergunta-e-resposta. Dá trabalho. Já basta. Por mim, iria para o vestiário, penduraria discretamente as chuteiras às 16:15 de hoje e cairia fora. Já conheço o circo. “Dou por visto”. Diagnóstico: patético. A recíproca, eu sei, é verdadeira. Ainda bem).
Se, numa hipótese absurda, um gênio da lâmpada se materializasse aqui e agora e me oferecesse um milhão de dólares por semana, um carro zero e um ano de férias numa ilha ensolarada no Pacífico para escrever a biografia de alguém, eu diria “obrigado, forasteiro, mas estou fora, fora, fora. Vivo satisfeito com meu Fiat 2003, minha conta bancária de vez em quando no vermelho, meu velho volume de poemas de Maiakóvski….Dão pro gasto”.
Por falar no poeta… Acorda, Maiakóvski, vem recitar aqueles versos: “Uma camisa lavada e clara / e basta / para mim, é tudo”.
É o que importa, é o que sempre importou.

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