quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Dilma e a ética pública - MERVAL PEREIRA



A manobra da presidente Dilma para esvaziar a Comissão de Ética Pública, que acabou gerando a demissão de seu presidente, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal Sepúlveda Pertence, mostra bem sua maneira de agir quando desagradada.

Depois de quase três meses sem se reunir, pois só contava com dois dos sete conselheiros, sem o quorum mínimo, portanto, de quatro membros para a realização de sessões, a comissão entrou em uma crise quando a presidente decidiu, afinal, preencher suas vagas. O não preenchimento das vagas passou uma mensagem clara do Palácio do Planalto: a comissão passara a ser um estorvo para o governo, que não tinha interesse em pô-la em funcionamento. Só depois que a imprensa chamou a atenção para a extinção branca da comissão, a presidente viu-se na obrigação de preencher as vagas no número mínimo para recolocá-la em condições de funcionamento.

Cinco mandatos se encerraram nos meses de junho e julho, e poderia haver reconduções para novos mandatos em dois casos, os dos conselheiros Marília Muricy e Fábio Coutinho. Nos outros três, a presidente da República teria, necessariamente, que nomear brasileiros sem passagem anterior pela CEP, pois já estavam em seu segundo mandato, como sempre foi praxe na comissão. Pois ela nomeou três novos conselheiros e não reconduziu os dois únicos que poderiam permanecer, justamente aqueles que haviam sido indicados por Pertence.

Mas não foi isso que os fez cair em desgraça junto ao Palácio do Planalto, e sim suas atuações em dois episódios envolvendo ministros do governo Dilma. Ambos atuaram na análise de denúncias contra o então ministro do Trabalho, Carlos Lupi, recomendando sua demissão após denúncia de que seu partido, o PDT, cobrava comissões de ONGs que tinham convênios com o Ministério do Trabalho.

A presidente Dilma, que parecia estar em meio a uma operação de faxina em seu Ministério para livrá-lo de corruptos, não gostou da orientação da comissão, pois seu plano era fazer a substituição sem romper politicamente com o PDT. Na ocasião, ela se disse desagradada por ter sabido através dos jornalistas da recomendação da comissão.

Não custa lembrar que o mesmo Lupi já tivera um enfrentamento com a mesma comissão - o que não é de estranhar - no governo Lula, quando o ex-ministro Marcílio Marques Moreira a chefiava. A comissão exigiu que Lupi deixasse a presidência do PDT enquanto exercesse o cargo de ministro do Trabalho, e ele durante meses resistiu à recomendação. Ao final de uma crise política tensa, a comissão exigiu a demissão de Lupi, obrigando-o a abrir mão da presidência formal do partido.

Os dois conselheiros que não foram reconduzidos aos seus cargos haviam também tomado parte da decisão de cobrar mais explicações sobre as palestras do ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, sendo que Fábio Coutinho fora o relator do caso. Muito ligado à presidente, Pimentel ficou em situação constrangedora no ministério, o que irritou a presidente, que não pretendia abrir mão de sua colaboração.

A "punição" sofrida pelos dois conselheiros demonstra que o Planalto, sob a gestão de Dilma, não admite ser confrontado por uma Comissão de Ética Pública que se considere independente.

Para não fugir ao hábito de difamar os adversários, ou os que passa a considerar como adversários, o Palácio do Planalto deixou "vazar" informações de que os motivos de desagrado de Sepúlveda Pertence seriam outros, bem menos nobres.

O ex-ministro do Supremo estaria desgostoso porque seu filho fora preterido, tanto por Lula quanto por Dilma, na escolha para ministro do Tribunal Superior Eleitoral. A posição republicana de Sepúlveda passaria a ter, nessa versão palaciana, motivação vulgar: reivindicação nepotista não atendida. O ex-ministro do STF portou-se de maneira elegante ao pedir demissão, sem explicitar as razões mais profundas que o levaram a sair, dizendo apenas que o fazia em solidariedade aos conselheiros não reconduzidos. Mas Sepúlveda admitiu que a tarefa de "impor limites éticos" ao governo é necessária, mas difícil.

A posição da presidente Dilma, ao contrário, acende uma luz amarela em relação à sua disposição de abrir o governo ao contraditório, na busca de um aprimoramento ético. Justamente o contrário daquela imagem de "faxineira ética" do início do governo.

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