sábado, 26 de setembro de 2015

J. R. Guzzo: Fim de feira Publicado na versão impressa de VEJA



J. R. GUZZO
Tudo que começa mal acaba mal, mas o governo da presidente Dilma Rousseff conseguiu trazer uma novidade para esse antigo ensinamento da sabedoria popular ─ está sendo capaz de acabar mal o que nunca chegou a começar. Um dia, mais cedo ou mais tarde, a presidente vai atravessar pela última vez a porta do Palácio do Planalto; é possível, até mesmo, que só acabe indo embora no fim do seu período oficial no emprego, em 1º de janeiro de 2019, data que cada vez menos gente ainda acha que é para valer. Mas, seja lá qual for o dia da saída, Dilma já está acabando. Deixa atrás de si, apenas, algo que Vinicius de Moraes descreveria como uma casa muito engraçada, que não tinha teto, não tinha nada; nela ninguém podia entrar não, porque a casa não tinha chão. É claro que muita gente acha bem pouca graça, ou não acha graça nenhuma, na conta que a presidente está assinando para largar em cima da mesa. Trata-se de um caso raro, sem dúvida: ao contrário do que em geral acontece com as casas, seu governo foi demolido, por ela própria, antes de ser construído. Mas é certo que será isso, precisamente, que vai sobrar após os “X” anos e “Y” meses, dias e horas que Dilma terá passado na Presidência da República: um sombrio trabalho de remoção de entulho, com preço exorbitante, sem previsão de entrega e com resultado final incerto. Seu destino, para quem acredita em destino, era ser derrotada ao fim da linha. Para quem não acredita, ela está acabando mal simplesmente porque nunca fez o mínimo necessário para acabar de outro jeito.
A presidente tem três anos e pouco (ou muito) pela frente até a hora prevista para o desembarque, e diante desse prazo a sensação majoritária (de sete entre dez brasileiros, talvez, pelo ronco das pesquisas de opinião) tem sido a seguinte: “Tudo isso, ainda? Não dá para aguentar até lá”. É compreensível, diante da misteriosa obsessão do Palácio do Planalto em dizer “não” quando deve dizer “sim”, e dizer “sim” quando deve dizer “não” ─ o que resulta nas calamidades de tamanhos diversos produzidas em tempo integral pela linha de montagem operada na alta gerência do Brasil para Todos. Mas poderia ser aceitável um raciocínio diferente: três anos, embora demorem a passar, também seriam tempo suficiente para consertar pelo menos uma parte da babilônia de desatinos que arrumaram em volta de si e contra todos nós. Na teoria, de fato, até que poderia ser assim. Na prática é opção inválida, pois o instinto automático da chefe e seus agentes, como mostram os fatos de cada dia, é usar todo o tempo disponível para repetir erros velhos, que já cometeram, e executar erros novos, que ainda não testaram. O último “pacote” de medidas para lidar com a falência em que meteram o Tesouro Nacional é exatamente mais do mesmo ─ uns rabiscos achados no fim de semana, com promessas que valem tanto quanto outras que Dilma fez e nunca respeitou, ordens que não serão cumpridas e aumento de impostos. Disso não sai.
A concordância mais ou menos geral é que o governo Dilma acabou antes de começar este segundo mandato; o mais provável é que não tenha começado nem o primeiro. Até hoje, nove meses depois de ter nomeado seu atual ministro da Fazenda, a presidente ainda não resolveu se é a favor ou contra ele, porque não consegue resolver se quer ou se não quer fazer o que o homem propõe. Mas já no começo do primeiro mandato deixou claro que seu principal talento era não se entender com ninguém, ordenar a execução de desejos em vez de projetos coerentes, e querer ao mesmo tempo coisas contrárias entre si. Há outro problema complicado ─ Dilma não gosta de ideias diferentes das suas. Mais: não tem interesse, nem sequer curiosidade, em saber que ideias poderiam ser essas. Após quase cinco anos na Presidência, continua irritada, ou indignada, ou estarrecida. Dá ordens que não são obedecidas, ou às quais os subordinados fingem obedecer ─ muitas vezes porque simplesmente não entendem o que ela está mandando fazer. Passa meses sem falar com a maioria dos seus 39 ministros e suas multidões de “homens-chave”, embora considere todos indispensáveis. Assina decretos que depois precisa anular, quando lhe avisam que não sabia o que estava assinando; sua obra-prima até agora, nesse quesito, foi a recente bula que pretendia reduzir prerrogativas dos comandantes das Forças Armadas, criação de uma militante do PT, enfermeira de formação e casada com um cacique do MST, que parece mandar no Ministério da Defesa.
Nada disso vai melhorar ─ em três ou em trinta anos. É o fim da feira.

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