terça-feira, 5 de maio de 2015

"O pão e a vaia", por Carlos Heitor Cony

Folha de São Paulo


Pode não ser verdade, mas o episódio é tão conhecido que, embora falso, a história o registrou. Na Revolução Francesa, o povo de Paris foi a Versalhes pedir pão ao rei Luís 16, que nem teve coragem de chegar a uma das janelas do seu palácio e dizer alguma coisa aos manifestantes irritados. Maria Antonieta, sua mulher e rainha, perguntou a um dos nobres que a acompanhavam o que o povo queria: "Pão". Admirada, a rainha respondeu: "Por que eles não comem bolos?"

No último 1º de Maio, dona Dilma nem quis perguntar nada. Contrariando a tradição, ela nem falou de corpo presente, preferiu uma rede social, privilégio ainda de uma minoria. Medo da vaia ou do panelaço. Certamente dos dois.

Não desejo uma guilhotina para ela. Mas invocar a Bolsa Família ou a Minha Casa, Minha Vida, dois programas assistenciais, não compensam as maravilhosas promessas de sua campanha para o segundo mandato. Podem ser consideradas um estelionato eleitoral.

Ela sequer mencionou os recentes escândalos de seu partido e na perspectiva histórica de seu governo como um todo. Não me dei ao respeito de ouvir a sua saudação no Dia do Trabalho. Acredito que ela tenha falado na corrupção dos outros, somente para repetir um dos mantras de sua campanha e de suas falas de quase todos os dias: o combate "inflexível" à corrupção –estou usando o "inflexível" como gentil homenagem ao lugar comum que a presidente tanto aprecia.

Por falar em mantra, usarei o meu: dona Dilma ainda não merece um impeachment, mas a honra da nação merece uma investigação isenta e honesta sobre a sua possível responsabilidade nos recentes escândalos. Por ora, não é caso para a guilhotina do impedimento, mas explica o seu receio e até mesmo seu pavor de enfrentar o povo que ela iludiu.

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