terça-feira, 25 de novembro de 2014

"Loteamento e integridade da Petrobras", por Claudio Weber Abramo Folha de São Paulo


Em um dos depoimentos que prestou no bojo da Operação Lava Jato, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa alegou ter intermediado o pagamento de uma propina de R$ 10 milhões ao ex-senador Sérgio Guerra (PSDB-PE) em troca de este colaborar para o esvaziamento de uma CPI cujos rumos embaraçavam a Petrobras.

A própria presidente Dilma Rousseff fez referência a esse possível suborno durante debate no segundo turno da eleição deste ano.

Digamos que as investigações venham a confirmar o fato. Ficaria então caracterizada uma ação criminosa praticada em nome da pessoa jurídica da Petrobras por um de seus dirigentes. Trata-se de situação diferente da que peculiariza as ações imputadas às empreiteiras implicadas na Lava Jato. Neste caso, a pessoa jurídica da Petrobras foi vítima do conluio entre empreiteiras e funcionários da empresa. Ou seja, tratou-se de corrupção "normal".

No caso do suborno a políticos para neutralizar a CPI, a beneficiária da corrupção terá sido a própria Petrobras. Trata-se de corrupção "anormal", no sentido de que terá sido promovida pela pessoa jurídica do próprio órgão público.

Os acontecimentos revelados no escândalo ocorreram ao longo de anos passados, de modo que a eles não se pode aplicar a Lei Anticorrupção (nº 12.846/2013), que estabelece a punibilidade administrativa de pessoas jurídicas por atos de corrupção praticados por seus representantes.

No entanto, a não retroatividade da lei não elimina a responsabilidade da pessoa jurídica da Petrobras. A se confirmar o suborno em questão, a Petrobras terá sido objetivamente responsável. Coisa semelhante ocorre com outro aspecto jurídico usualmente associado à corrupção empresarial: a inidoneidade.

Caso a Petrobras fosse uma empreiteira que tivesse disputado licitações para conquistar contratos de exploração de petróleo, construção e operação de refinarias etc., o fato de promover o suborno de agentes públicos (parlamentares, no caso) a enquadraria no inciso 3º do artigo 88 da lei de Licitações e Contratos (nº 8.666/1993), tornando-a passível de ser declarada inidônea.

Uma empresa inidônea fica impedida de fazer negócios com o poder público por cinco anos. Não pode ser contratada, manter concessões, beneficiar-se de financiamentos públicos e assim por diante. Tratando-se da Petrobras, isso significaria que ela não mais poderia exercer as suas atividades. Simplesmente desapareceria.

Outra vez, a Petrobras não poderá ser declarada inidônea porque a concessão de que goza para operar não decorre de licitação. Contudo, também neste caso, a circunstância de a estatal não ser legalmente imputável não significa inocência: os atos atribuíveis à pessoa jurídica da Petrobras por intermédio de seus dirigentes a caracterizam como uma empresa à qual falta integridade.

Ingrediente adicional é oferecido por duas investigações sobre a Petrobras que correm nos EUA: uma pela Securities and Exchange Commission (que cuida do mercado de capitais) e outra, criminal, pelo Departamento de Justiça.

Esse estado de coisas catastrófico é consequência de dois fatores complementares: a falta de controle público sobre a empresa e o loteamento político a que é submetida.

Não apenas a empresa é tomada pela criminalidade como o papel que a estatal poderia desempenhar no desenvolvimento econômico do país a partir de seu imenso poder de alavancagem é desvirtuado.

Caberia à presidente da República tomar a besta pelos chifres, atacando as causas da falta de integridade da empresa. Poderia iniciar pela mudança da regra do jogo do loteamento político que marca a gestão pública no país. Poderia, ainda, submeter a debate mais amplo as políticas sacramentadas no Conselho de Administração da Petrobras.

Por último, mas não menos importante, poderia patrocinar a alteração do regulamento especial de licitações da estatal, garantidor de direcionamento e propinagem.

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