domingo, 19 de maio de 2013

ARTIGOS: PERGUNTA INEVITÁVEL - MARCELO GLEISER - POBRE ARGENTINA: SUELY CALDAS



Pergunta inevitável? - MARCELO GLEISER

FOLHA DE SP - 19/05

A passagem do tempo e o fato de que temos consciência dela compõem, talvez, a condição que mais nos define

Nesta semana estive no Brasil dando uma palestra em um evento corporativo. Havia umas 200 pessoas, de várias regiões do Brasil, executivos e administradores.

Minha missão era iniciar uma reflexão macro, tirando as pessoas de sua área de conforto, colocando questões que, na correria da vida, tendemos a deixar de lado.

Como pediram para que eu falasse sobre o homem, o tempo e o espaço, embarquei numa discussão de como a ciência moderna vê a questão da existência humana: suas origens, seu significado, sua incumbência enquanto espécie, seu destino. Nada mais estimulante do que dividir minhas reflexões sobre esses temas tão fundamentais.

Comecei falando de como somos criaturas limitadas pelo tempo, com uma história que começa e acaba; mostrei que, tal como nós, assim são também as estrelas e o próprio Universo, cada qual com a sua história.

A passagem do tempo e o fato de que nós, como espécie, temos consciência dela são, talvez, a condição que mais nos define: a consciência que temos da nossa existência e da sua finitude.

Argumentei que muito do esforço criativo humano, nossos poemas e nossas sinfonias, a literatura, as ciências e a filosofia, enfim, a soma total da produção cultural da nossa história coletiva podem ser vistos como uma resposta a esses anseios, como uma tentativa de compreender a razão de nossas vidas.

Amor, reprodução, poder e relacionamentos, são manifestações de quem somos e de como escolhemos viver nossas vidas.

Passei para a questão das origens: do Cosmo, das estrelas, da vida, mostrando que todas as culturas de que temos registro oferecem uma narrativa da criação, um esforço de explicar de onde veio tudo.

Olhar para o céu e ver milhares de estrelas nos remete, inevitavelmente, à questão da existência de outros mundos, da possibilidade de que não estamos sós no Universo. Mais ainda quando aprendemos que apenas em nossa galáxia, a Via Láctea, existem em torno de 200 bilhões de estrelas, o Sol sendo apenas uma delas.

Mostrei imagens belíssimas tiradas por sondas espaciais, como o telescópio espacial Hubble, explicando como essas máquinas maravilhosas são um depoimento da criatividade humana: esses pequenos robôs atravessam milhões de quilômetros pelo espaço sideral, visitando outros mundos controlados aqui da Terra por pessoas como nós.

Sugeri que devemos celebrar esses feitos tecnológicos como celebramos outras grandes obras da humanidade, das pirâmides às catedrais medievais, da arquitetura de Brasília à Mona Lisa e às sinfonias de Beethoven.

Mostrei que, diferentemente do que a maioria pensa, e como explico no livro "Criação Imperfeita", quanto mais aprendemos sobre o Cosmo, mais relevantes ficamos: aglomerados moleculares de poeira estelar capazes de refletir sobre quem somos, de construir máquinas que nos permitem ver além da nossa percepção tão limitada do real.

Tentei, com palavras e imagens, celebrar a condição humana e a beleza austera do Cosmo.

E, ao fim de tudo isso, tão inexorável quanto a passagem do tempo, veio a pergunta inevitável: "O senhor acredita em Deus?"


Pobre Argentina - SUELY CALDAS

ESTADÃO - 19/05

A Argentina vai mal. Divide com a Venezuela a posição de pior economia da América Latina e sua situação deteriora com impressionante rapidez, comprova pesquisa da Fundação Getúlio Vargas em parceria com o instituto alemão Ifo - que juntos elaboram um índice de clima econômico na região. Em apenas quatro meses, entre janeiro e abril deste ano, esse índice na Argentina desabou de 5,2 para 3,4 pontos e a expectativa é de que haja piora diante de uma onda de desinvestimentos, com empresas desistindo de projetos ou abandonando o país.

Segundo a pesquisa, os problemas que empurram a Argentina para o abismo obedecem esta ordem: falta de confiança em políticas públicas, inflação em alta, competitividade em baixa, déficit público e escassez de capital. São efeitos de uma política - que se tem mostrado fracassada em países da América Latina - de miúdas e graúdas intervenções do governo na economia, mudando regras a todo instante e criando um ambiente instável e desfavorável para decisões de investimentos. Para tocar um negócio, é preciso haver um mínimo de estabilidade de regras.

Em março, a brasileira Vale desistiu de um bilionário projeto de exploração de potássio no Rio Colorado. Motivo: os desequilíbrios cambiais derivados de sucessivas intervenções do governo dobraram o custo do negócio, de US$ 5,9 bilhões, em 2009, para US$ 10,9 bilhões, no início deste ano. O governo brasileiro não gostou da decisão da Vale, mas como obrigar uma empresa privada a rasgar dinheiro?

Mesmo a estatal Petrobrás tem planos para desembarcar do atoleiro argentino. "A Petrobrás argentina está no nosso portfólio de desinvestimentos", respondeu há dias a presidente Graça Foster a parlamentares que indagavam se procedia notícia publicada na imprensa portenha segundo a qual a estatal teria vendido 51% dos ativos da subsidiária argentina para a Oil Combustibles. "Estamos negociando a venda desses ativos, mas não há nada fechado", respondeu ela.

Tem razão Graça Foster: a Petrobrás só conseguiu enviar ao Brasil 10% dos US$ 22 milhões que pretendia, no ano passado. Além disso, a empresa foi penalizada por longo congelamento de preços dos combustíveis aqui e seus recursos estão muito abaixo do necessário para cumprir seu programa de investimentos no Brasil. Para fazer caixa, ela partiu para um plano de desinvestimentos em que a venda de ativos na Argentina desponta na liderança.

Vale e Petrobrás, no entanto, não estão sozinhas. A mineradora Los Andes, controlada pela canadense McEwen Mining, anunciou a revisão de um projeto de extração de ouro, prata e cobre avaliado em US$ 2,7 bilhões. Paradas e também à espera estão a Cerro Vanguardia e duas outras empresas de mineração: Mansfield e Siles. Já a Minera Argentina, da canadense Pan American Silver, desistiu de suas operações e subtraiu US$ 800 milhões em investimentos. Só no setor de mineração os projetos suspensos causaram uma perda estimada em US$ 15 bilhões, que deixarão de entrar na Argentina nos próximos três anos.

Defasagem cambial, inflação elevada, barreiras às importações, restrições à remessa de lucros das empresas e carga tributária elevada são os problemas criados pelo governo e que têm afastado investimentos estrangeiros, imprescindíveis para um país que não tem poupança interna para tocar seu progresso. Incalculável, a perda de empregos vai à casa dos milhares e a Argentina deixa de produzir riqueza e renda para sua população.

Casal populista. Desde o governo Néstor Kirchner, o problema da Argentina é de um estilo de gestão populista, em que interesses políticos imediatos subjugam a economia e prejudicam o progresso econômico no longo prazo. E, como a repetição dessa prática acaba produzindo resultados desastrosos adiante, chegou a hora de pagar a conta da inconsequência. Coube a Cristina Kirchner fazê-lo agora.

Morto em outubro de 2010, Néstor Kirchner assumiu o poder em 2003, com o país no caos financeiro e uma moratória que dramatizou a pobreza. Três anos depois, ele reduziu o desemprego para 10%, saiu da moratória e acumulou reservas cambiais, mas a pobreza se manteve em 33,5% da população. Só que Kirchner enveredou pelos caminhos do populismo político de ganhar a eleição a qualquer preço. Como a inflação ameaçava a reeleição, ele decretou intervenção no Indec (o IBGE de lá), demitiu técnicos sérios que se negaram a manipular pesquisas e passou a divulgar índices de inflação desmoralizados e desacreditados dentro e fora da Argentina.

Calculada por instituições sérias, em 2012 a inflação real foi de 25,6%, mas a fantasiosa do governo ficou em 10,8%. A manipulação se estendeu ao cálculo da pobreza, que o Indec afirma ter sido reduzida para 5,4% da população em 2012 e a Universidade Católica Argentina (UCA), que há anos elabora um índice paralelo, dimensionou em 26,9%.

Como o índice oficial é o que prevalece nas negociações salariais, nos últimos anos as lideranças sindicais trabalhistas passaram a fazer oposição a Cristina. Mas como chegou a hora de pagar a conta e com uma eleição legislativa se aproximando, na quinta-feira ela fechou um acordo com seis sindicatos aliados para elevar em 24% os salários de 2 milhões de trabalhadores, reconhecendo, afinal, a inflação de 26,9%. Os sindicatos opositores, porém, já anunciaram que vão reivindicar 30%.

Além de lideranças sindicais, Cristina vem perdendo apoio de personalidades populares no país. O caso mais recente foi o do ator Ricardo Darin, respeitado mundialmente no mundo do cinema, que rompeu com a presidente depois de questionar o rápido enriquecimento do casal Kirchner. Denúncias de corrupção e enriquecimento ilícito, aliás, não faltam na Argentina. Num programa de TV, a ex-secretária de Néstor Kirchner Mirian Quiroga denunciou que bolsas cheias de dinheiro chegavam à Casa Rosada durante o governo do ex-presidente e afirmou que sua mulher e sucessora, Cristina Kirchner, sabia das operações do marido. A acusação foi parar na Justiça.

Em dez anos de governo do casal Kirchner, a política degradou e a economia desandou na Argentina. Inflação alta e crescimento baixo são o que se espera para 2013. Cristina e seus aliados terão dificuldades nas próximas eleiçõe

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