sábado, 13 de maio de 2017

Um banco amigo | Miriam Leitão

Um banco amigo | Miriam Leitão

- O Globo

O BNDES aportou mais de R$ 620 milhões para o JBS comprar a National Beef nos Estados Unidos, mas a autoridade antitruste de lá vetou a aquisição. O banco, então, deixou o dinheiro com o grupo para ajudar no fluxo de caixa na crise ou para outras compras. O BNDES e o JBS eram assim: amigos. A operação de ontem está investigando várias esquisitices no tratamento que o grupo recebeu do banco.

Há de tudo, segundo se pode ver em quatro casos periciados pela Polícia Federal. Prazos que terminam e são sucessivamente prorrogados, ações convertidas a preços favorecidos, explicações contraditórias, dispensa de garantias. No caso da National Beef, a BNDESPar poderia ter cancelado a subscrição quando o negócio não pôde ser realizado. Mas não o fez.

Alegou, num dos aditivos, que havia uma crise de liquidez no mundo em 2009 e isso eliminaria uma folga de caixa na JBS. Em outro aditivo informou que a empresa faria “uma ou mais compras” de ativos no exterior. A perícia da PF estranha essa mudança de motivos.

“Na única seção opinativa, eles repetiram o argumento da análise anterior sobre a folga de caixa do JBS e acrescentaram que ‘é factível que surjam oportunidades de aquisição em decorrência da desvalorização generalizada dos ativos no mundo.’ Essa frase além de genérica, não foi seguida de uma manifestação dos próprios técnicos quanto ao seu mérito”.

Normalmente uma operação assim é precedida de um estudo sobre a viabilidade do negócio específico, não pode ser genericamente transferida para outra finalidade. Portanto a operação teria que ser desfeita. “Os técnicos do BNDES se abstiveram de emitir opinião, favorável ou contrária, acerca do termo aditivo mencionado, limitando-se a informar que ele tinha sido ‘negociado com os controladores do JBS’”.

A Polícia Federal concluiu, com base na perícia em documentos e em auditoria do TCU, que algumas operações produziram prejuízo para o banco. Ao todo o JBS recebeu R$ 8,1 bilhões de empréstimos, ou venda de debêntures à BNDESPar para comprar ativos no exterior. A ideia por trás das operações era que o banco ajudaria o grupo a se internacionalizar.

No fim de 2009 foi feita outra operação no valor de R$ 3,5 bilhões para que o grupo pudesse comprar o frigorífico Pilgrim’s Pride e o grupo Bertin. Neste caso, a perícia da PF apontou que o valor da conversão das debêntures em ações foi por um preço acima do que deveria ter sido se seguisse os próprios termos do contrato. Essa diferença de valor representou no cálculo da Polícia Federal um prejuízo de R$ 614,5 milhões para a BNDESPar.

“Observe-se que o prejuízo calculado está expresso em valores da época e não leva em conta possíveis benefícios inerentes ao invetimento em capital societário, tais como: dividendos, bônus de subscrição, diretos de subscrição de ações”.

Nos documentos do BNDES, a PF diz que a explicação do banco foi que era preciso evitar “um crescimento excessivo na participação societária do BNDESPar na JBS”. A operação também foi criticada pelo TCU.

“Poderia a BNDESPar ter buscado em conjunto com a JBS outra solução econômico financeira que não resultasse em cessão graciosa de dinheiro público”. Onze meses depois, o banco concordou em transferir as ações ao JBS a um preço 14% inferior ao usado na conversão das debêntures.

A PF ressalta três outros pontos: nesta operação o BNDES dispensou as garantias; abriu mão do prêmio de 10% a que tinha direito e fez uma aprovação expressa. O prazo de processamento é em média de 210 dias. Na compra da Pilgrim’s Pride foi de 29 dias.

O crescimento do JBS foi vertiginoso. No primeiro trimestre de 2007, quando a empresa começou a publicar suas informações financeiras, o patrimônio líquido era de R$ 1,39 bi. Essa linha do balanço saltou para R$ 23,77 bi ao final de 2016, de acordo com a consultoria Economatica. Ou seja, em dez anos, o patrimônio do JBS cresceu 17 vezes.

A operação de ontem teve como alvo o ex-presidente do banco Luciano Coutinho, que está voltando do exterior, e os dois principais acionistas do JBS, Joesley e Wesley Batista. Os motivos que levaram a tanta generosidade do banco com o grupo nunca ficaram bem entendidos. E a dúvida continua.

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