sexta-feira, 19 de maio de 2017

Crimes em série | Merval Pereira


- O Globo

O que se ouve nos áudios que registraram conversas nada republicanas entre o presidente Michel Temer e o senador Aécio Neves com o dono da JBS Joesley Batista, em momentos distintos, é uma série de crimes sendo descritos, sendo premeditados. E demonstram que continua em marcha uma ação no Congresso para anistiar os parlamentares acusados de corrupção na Operação Lava-Jato e obstruir as investigações.

As conversas demonstram que os procuradores de Curitiba e o juiz Sergio Moro têm razão ao defender as prisões preventivas alongadas para impedir que os crimes continuem acontecendo. Mesmo assim, eles acontecem, como fica claro nos diálogos. O ex-deputado Eduardo Cunha tem a atuação semelhante aos chefes de facções criminosas, que continuam controlando o crime de dentro da cadeia.

Tanto Temer quanto Aécio Neves, presidente afastado do PSDB, pedem apoio do empresário para que pressione parlamentares ainda indecisos — como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia — e também que organize uma ação de empresários para conseguir a aprovação no Congresso da anistia política, esta uma sugestão de Temer que ele pede que não seja atribuída a ele.

O presidente Michel Temer ouviu relatos estarrecedores de Joesley sobre ações de apoio ao expresidente da Câmara Eduardo Cunha e ao doleiro Lucio Funaro, a partir do minuto 11 do vídeo: “Zerei tudo, liquidei tudo e ele foi firme. Veio cobrou, eu acelerei o passo e tirei da frente”, diz o empresário. Joesley disse ainda que Cunha, mesmo na cadeia, cobrava o que considerava ser uma dívida de propinas.

A certa altura, Joesley diz que, depois de todas essas providências, está bem com Eduardo Cunha, e ouve do presidente Temer: “Tem que manter isso, viu?”. A sequência da conversa não deixa dúvidas, como ressalta o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, de que falavam de dinheiro que Joesley dava aos dois presos todo mês. “Eu tô segurando as pontas."

Além do relato sobre a mesada a Cunha, Joesley Batista deu detalhes estarrecedores ao presidente Michel Temer sobre como está “se defendendo” das investigações de que é acusado. Contou que está “segurando” o juiz e o juiz substituto do caso, estaria tentando mudar o procurador “que está atrás de mim”, e conseguira infiltrar um procurador na força-tarefa que investiga a JBS.

O presidente Temer ouviu tudo sem pelo menos um comentário crítico e, quando reagiu, foi para repetir: “Está segurando os dois”. O procurador infiltrado é Angelo Villela, preso ontem pela Operação Patmos. Ele já esteve no Congresso defendendo as Dez Medidas contra a Corrupção apresentadas pelos procuradores de Curitiba.

Essas mesmas medidas, apresentadas como soluções para a crise moral em que estamos afundados, seriam o instrumento para uma legislação que anistiaria os parlamentares acusados de corrupção. O senador Aécio Neves, suspenso de suas funções parlamentares pelo ministro do Supremo Luiz Edson Fachin, comentou com Joesley que estava trabalhando em um projeto de anistia dentro das 10 medidas contra a corrupção.

Em um linguajar recheado de palavrões, ele relatou que “o negócio agora não dá para ser mais na surdina, tem que ser o seguinte: todo mundo assinar, o PSDB vai assinar, o PT vai assinar, o PMDB vai assinar, tá montada. A ideia é votar na... Porque o Rodrigo devolveu aquela tal das dez medidas, a gente vai votar naquelas dez... Naquela merda das Dez Medidas toda essa porra”.

Resolvido isso, o senador Aécio Neves diz que o projeto é “entrar no abuso de autoridade”. Ele garante que já conversou com Michel Temer, que prometeu aprovar a nova legislação.

O presidente Michel Temer disse ontem à tarde, em tom enfático, que não renunciará porque sabe o que fez e não teme delações premiadas. Temer parece ter perdido a noção do que seja certo ou errado, já que a conversa que teve com o empresário Joesley Batista o desqualifica para continuar exercendo a Presidência da República.

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