terça-feira, 24 de maio de 2016

A crise previsível - Míriam Leitão


- O Globo

Era previsível que a primeira crise do governo Temer seria com Romero Jucá. O senador tem qualidades para assumir o cargo, entende de orçamento, afinou o discurso com o ministro da Fazenda, mas ele tinha, desde o começo, um calcanhar de Aquiles. Mais do que citado na Lava-Jato, ele é um investigado. O presidente interino assumiu um risco ao nomeá-lo e ontem pagou o preço.

Não demorou 15 dias para que a crise estourasse com a divulgação das conversas de gravação oculta que teve com outro encrencado da Lava-Jato. O curioso é como pessoas inteligentes não veem o óbvio: não há como interferir na Operação. O Ministério Público é independente, a Justiça Federal é independente, se tentarem amordaçar a Polícia Federal a opinião pública saberá. Se tentarem pressionar ministros do Supremo podem ser presos. De onde é que tiram a ideia de que podem estabelecer um freio na Lava-Jato?


O governo Temer foi montado com a ideia de que se fosse com parlamentares seria mais fácil aprovar as propostas difíceis que tem pela frente. O problema é que ao nomear os ministros, Temer acabou escolhendo investigados e citados na Lava-Jato. De todos esses, Romero Jucá assumiu posição de mais destaque e já estava sendo investigado. Era difícil considerar que não haveria uma revelação. E ela veio pela própria boca do ministro, na conversa com outro peemedebista sobre o qual pairam dúvidas.

O gesto de ir ao Congresso entregar pessoalmente a nova meta fiscal — e desta forma demonstrar respeito ao Congresso — se perdeu no burburinho em torno da sorte do ministro do Planejamento. A licença que ele pediu não cessará os ataques contra ele. Esta segunda semana de governo é fundamental para aprovar a nova projeção de déficit, e para o anúncio das medidas com as quais o governo pretende sair do rombo. Tudo isso acabou afetado pela crise com o ministro do Planejamento.

O que o presidente deveria fazer é nomear um quadro técnico para o Ministério do Planejamento e assim completar o trabalho de blindagem da área econômica contra as turbulências que inevitavelmente vão sacudir seu governo. Trocar por outra pessoa que possa ser abalada por revelações mais dia menos dia só manterá o ambiente de crise que ontem cercava o governo provisório.

O ministro Romero Jucá enfrenta investigação aberta por decisão do Supremo Tribunal Federal. Além dele, o ministro Henrique Alves, do Turismo, é investigado e alvo de dois pedidos para abertura de inquérito pela PGR que ainda serão analisados pelo Supremo. O ministro chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, o homem que tocará as concessões e privatizações Moreira Franco, o secretário do governo, Geddel Vieira Lima, foram citados em conversas de delatores da Lava-Jato.

Ao pedir licença, após a divulgação do inteiro teor da gravação, Romero Jucá se inspirou em Henrique Hargreaves, que fez o mesmo no governo Itamar Franco, mas diante de uma acusação muito vaga e que logo se mostrou inconsistente. Jucá é pessoa controversa desde que entrou na vida pública. Sua maneira de enfrentar a acusação, ontem, indo diretamente falar com a imprensa foi a atitude correta, mas não resolveu o problema. Não adiantou, a exoneração era a única saída desde o começo. A gravação foi devastadora.

Os gritos dos petistas de “golpista”, ouvidos ontem, vão perseguir o governo Temer enquanto ele durar. Eles sempre foram bons de agitação, mas ao governar deixaram o país com as contas em estado lastimável e são o principal alvo da Operação LavaJato. E por isso são muitos os líderes petistas que, tanto quanto o ex-ministro Romero Jucá, devem explicações ao país e à Justiça.

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