domingo, 28 de fevereiro de 2016

Esquema político na AL - Merval Pereira


- O Globo

Assim como ao investigar o tríplex que seria do ex-presidente Lula no Guarujá, a Operação Lava-Jato se deparou com diversos apartamentos registrados em offshores no Panamá — fazendo com que os procuradores do Ministério Público Federal vislumbrassem que haviam chegado a um novo filão de crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro —, ao investigar as contas internacionais, secretas ou declaradas, do marqueteiro João Santana, a operação pode ter se deparado com um grande esquema ilegal de financiamento de projetos políticos de esquerda pela América Latina e a África.

Em diversos desses países, o marqueteiro João Santana recebeu pagamentos ilegais através de empresas de offshores irrigadas pela Odebrecht, que também tinha interesses na eleição de políticos do esquema devido a financiamentos de grandes obras de infraestrutura.

Esse projeto de esquerda que chegou ao poder há cerca de 15 anos na região com a primeira eleição de Hugo Chávez na Venezuela foi gestado no Foro de São Paulo, organismo criado por Lula e Fidel Castro em 1990 a partir de um seminário internacional. Partidos e organizações políticas da América Latina e do Caribe, em baixa naquele momento, reuniramse para discutir uma atuação conjunta de resistência ao que consideravam “políticas neoliberais” que dominavam a região.

A integração latino-americana passou a ser um projeto comum com a chegada ao poder de vários daqueles líderes. Hoje, embora muitos deles continuem no poder, os ventos políticos na região estão mudando. Na Bolívia, Evo Morales, do Movimento para o Socialismo, acabou de perder o plebiscito e não poderá concorrer a um quarto mandato. No Brasil, Dilma Rousseff do PT enfrenta a ameaça de um processo de impeachment; na República Dominicana, Danilo Medina (Partido de Libertação Dominicana) corre o risco de perder a reeleição devido ao escândalo da prisão do marqueteiro João Santana no Brasil.

A Venezuela passa por uma crise econômica e política sem precedentes e Nicolás Maduro, do Partido Socialista Unido da Venezuela, perdeu o domínio do Congresso em eleições recentes. Continuam no poder vários outros membros do Foro de São Paulo: Chile (Michelle Bachelet - Partido Socialista do Chile), Cuba (Raúl Castro - Partido Comunista de Cuba), Dominica (Roosevelt Skerrit - Partido Trabalhista da Dominica), Equador (Rafael Correa - Alianza País), El Salvador (Salvador Sánchez Cerén - Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional), Nicarágua (Daniel Ortega - Frente Sandinista de Libertação Nacional), Peru (Ollanta Humala - Partido Nacionalista Peruano) e Uruguai (Tabaré Vázquez - Frente Ampla). Olanta Humala aparece em uma das anotações apreendidas pela Operação Lava-Jato, mas nega que tenha recebido dinheiro da Odebrecht.

A atuação internacional da empresa de João Santana começou em 2003, na Argentina, onde coordenou campanhas legislativas, municipais e governamentais até 2007 na região de Córdoba. Em El Salvador, a Pólis fez a campanha que elegeu presidente Maurício Funes, em 2009, eleito pela Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional ( FMLN), grupo guerrilheiro formado nos anos 1980 que se transformou em partido em 1992 e nunca havia chegado ao poder.

Em 2012, a Pólis atuou em três campanhas. Em Angola, elegeu o presidente José Eduardo dos Santos pelo Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). No mesmo ano, reelegeu na Venezuela o ex-presidente Hugo Chávez (1954-2013).

Na República Dominicana, também em 2012, Santana coordenou a campanha de Danilo Medina, que disputou contra o ex-presidente Hipólito Mejía. Nesse período, João Santana ainda coordenou o marketing político da campanha de José Eduardo Santos em Angola, que teria custado U$ 50 milhões, sendo que parte foi paga em dinheiro não contabilizado na offshore dos Santana na Suíça. A Operação Lava-Jato está desvendado toda essa rede de corrupção de campanhas políticas na América Latina, Caribe e África, definindo qual o papel da Odebrecht na distribuição ilegal de dinheiro pela região em que tem interesses em grandes obras de infraestrutura, a maioria delas financiada pelo BNDES.

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