sexta-feira, 24 de abril de 2015

"Paixões escravas", por Reinaldo Azevedo - Folha de São Paulo



A Petrobras teve um prejuízo em 2014 de R$ 21,587 bilhões. O espeto da corrupção, segundo os valores admitidos pela empresa –não se trata de contrapropaganda da oposição–, ficou em R$ 6,194 bilhões. Os ativos sofreram uma correção para baixo de R$ 44,345 bilhões. E, ora vejam!, nada disso era necessário; nada disso era parte de uma ordem inexorável, sem a qual não haveria amanhã.

Esses rombos não pertencem à natureza das coisas, a exemplo da lava de um vulcão, que vai crestando o jardim de Deus e todo o engenho humano, já que as entranhas da Terra não reconhecem nossas precárias delicadezas. Levar a Petrobras à lona decorreu de um plano, de uma decisão, de uma deliberação.

Arranjar os números para que uma empresa possa assimilar um desaforo de mais de R$ 6 bilhões decorrentes apenas do "custo corrupção" não tem paralelo na história do capitalismo. O que se viu na Petrobras, registre-se, capitalismo não é.

É evidente que as responsabilidades individuais e partidárias devem ser buscadas e que os envolvidos em tramoias têm de arcar com o peso de suas escolhas. Mas estou mais interessado na criação de um sistema que cerque as margens de erro e de safadeza –para que os desmandos não voltem a ocorrer– do que em cortar cabeças, ainda que eu não vá chorar por aquelas que eventualmente rolarem.

O passado da Petrobras é matéria da Justiça, mas o futuro da empresa é matéria de eficiência. É apreciável o propósito de ser justo, e quero na cadeia os ladrões. 

Mas é uma questão de sobrevivência fazer as escolhas certas. Pode-se praticar justiça mesmo na hora final, como no Armagedom, mas isso não basta para construir amanhãs. Só a moral ilibada não traz o petróleo à flor da terra a um custo aceitável.

Aquela que já foi a maior empresa brasileira encerrou o ano passado com uma dívida de R$ 351 bilhões, o que aniquila seu planejamento estratégico. É evidente que também a teia de incompetência, ideologia e mistificação em que foi enredada tem de ser destruída.

Não estamos numa tertúlia a opor guelfos e gibelinos, estatistas e privatistas, liberais e desenvolvimentistas. Todos os absolutos se tornaram obsoletos diante da evidência matemática de que ativos terão de ser vendidos e de que a empresa não pode continuar com a incumbência de ser a parceira obrigatória na exploração do pré-sal. Não há dinheiro para isso.

O misto de má-fé e de má-consciência do petismo contribuiu, sim, para levar a Petrobras à lona, mas é importante termos claro que os valentes teriam quebrado a empresa ainda que fossem puros como as flores. O mal desses caras não está apenas naquela longa franja ética que os leva a pregar uma coisa e a fazer outra. O mal dos companheiros –este, sim, um valor absoluto– consiste na crença de que o Estado pode ser mais eficiente do que a sociedade. Ou por outra: como hipótese ao menos, pode até existir petismo inocente –não creio–, mas jamais existirá um petismo virtuoso.

Informa o Datafolha que 61% dos entrevistados são contrários à privatização da Petrobras. Segundo Oscar Wilde, todo homem mata aquilo que ama. É um gesto de terrível altanaria senhorial. O sentimento moralmente escravo faz o contrário: ama aquilo que o mata.

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