segunda-feira, 8 de julho de 2013

GENETON MORAES NETO: 'ESPIONAGEM AMERICANA NO BRASIL'

O dia em que o ministro Fernando Henrique Cardoso descobriu o que é “espionagem”: secretário de estado americano sabia mais sobre segredo militar brasileiro do que ele

seg, 08/07/13
por Geneton Moraes Neto |
categoria Entrevistas


Quando era ministro das Relações Exteriores do presidente Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso teve, na prática, uma  lição de como a “espionagem” funciona. Durante uma escala nos Estados Unidos, a caminho de uma missão diplomática no Japão, FHC ouviu do secretário de estado americano, numa conversa privada, uma pergunta sobre um segredo militar brasileiro.  FHC desconhecia o assunto. Já na presidência, Fernando Henrique soube que o projeto a que o secretário americano se referia de fato existia. Em suma: o secretário de Estado americano sabia mais sobre o Brasil do que o então ministro das Relações Exteriores brasileiro.
Numa entrevista que fiz com ele ( publicada, na íntegra, no livro DOSSIÊ BRASÍLIA : OS SEGREDOS DOS PRESIDENTES” – que traz, também, depoimentos de José Sarney, Fernando Collor e Itamar Franco), FHC descreve a cena: 
Qual o grande segredo o senhor teve de guardar quando estava no poder mas pode revelar hoje ?
FHC: “Não é um grande segredo. Aconteceu antes de eu estar na presidência: quando estava indo para o Japão, como chanceler do presidente Itamar, passei pelos Estados Unidos, onde o secretário de Estado, Warren Christopher, depois de uma conversa agradável que teve comigo e com várias pessoas, me disse que precisava me falar em particular: “Ministro, temos informações de que o Brasil vem obtendo material secreto da Rússia para fazer mísseis” .  Fiquei surpreso ! Brinquei na resposta que dei ao secretário de Estado: “Se o Brasil e a Rússia estão fazendo, só se for com financiamento americanom porque estamos em uma crise grande…”
Tempos depois, já como presidente da República, fui informado de que o Brasil tinha, efetivamente, conseguido controlar o sistema de lançamento de satélites – que, na verdade, é o mesmo ( usado para mísseis). Era esse o fato.
Tomei, então, a seguinte decisão: “Vou anunciar ao mundo que o Brasil dispoe da tecnologia”. Combinei com os ministros militares e com o Itamaraty que iríamos propor que o Brasil entrasse para o sistema internacional de controle – que se chama MTCR ( Missile Technology Control Regime – ou Regime de Controle de Tecnologia de Mísseis).
Vim para São Paulo, fui até São José dos Campos, para o lançamento de um avião da Embraer que faz tanto sucesso hoje: o 135. Fiz o discurso. Tive, então, uma surpresa: ninguém no Brasil deu importância ao que eu disse ! Só quando saiu publicado nos Estados Unidos é que deram importância. De fato, tínhamos nos apoderado da tecnologia para o lançamento de satélites”.
O governo americanoo estava mais bem informado do que o senhor ?
FHC: “O governo americano sabia ! Quando voltei daquela viagem, falei com o presidente Itamar – que também não estava informado sobre o assunto. Aquilo foi feito com discrição. Era uma coisa boa: um desenvolvimento tecnológico nosso”.
Depois de eleito presidente, Fernando Henrique Cardoso teve conversas privadas com o presidente americano Bill Clinton. Num desses encontros, Clinton insinuou que o Brasil poderia ter uma presença militar na Colômbia, país que enfrentava dois problemas gigantescos: os cartéis da droga e a força da guerrilha:
O que é que o presidente Bill Clinton dizia ao senhor em conversas privadas ? O senhor foi convidado a passar um fim de semana en Camp David, a residência de verão do presidente…
FHC: “Fui a Camp David. O presidente Clinton queria que o Brasil tivesse um papel mais ativo na Colômbia – e até no Oriente Médio. Os americanos gostam que o Brasil tenha tenha um papel mais ativo em casos assim. Mas eu eu era muito restritivo, sobretudo diante da sugestão de que o Brasil fosse mais ativo na Colômbia, onde há guerrilha. Isso signficava, no fundo, presença militar brasileira. O que havia, ali, não era uma insistência de Bill Clinton: era uma conversa em que achava que o Brasil poderia ter esse papel.
Conversamos bastante sobre História. Clinto sabe muito de História: é um homem de cultura. Impressionou-me muito quando falou sobre a China e sobre a Rússia. Disse o seguinte: “A deve sempre perguntar a um país como esse: do que é que ele tem medo ? Qual o medo histórico desse país ? Qual é a ambiçao ? Por exemplo: a Rússia deve ter medo de ser invadida, porque já sofreu invasões várias vezes. Já a China deve ter medo de ser despadaçada pelos chefes da guerra. Deve-se perguntar: qual é a ambição de países assim ? São expansionistas ? Não são expansionistas ?”.
O senhor achou, então, que o presidente Bill Clinton esperava que o Brasil tivesse uma presença militar na Colômbia ?
FHC: “Clinton não me disse com essas palavras, mas a verdade era essa. Isso foi antes de os Estados Unidos terem essa presença tão ativa. O que ele disse foi: “O Brasil poderia ter um pouco mais de preocupação….”. Mas, nessa matéria, tínhamos uma posição muito mais retraída e muito menos intervencionista”.
Que resposta, então, o senhor deu ao presidente Bill Clinton quando ele fez essa insinuação sobre a presença militar do Brasil em território colombiano ?
FHC: “Clinton não falou nesss termos, em “militar”. É que havia, na Colòmbia, a guerriha e a droga – a questão mais séria. A resposta que dei foi a seguinte: “Temos no Brasil nossa política antidrogas, temos também a floresta amazônica – que, de alguma maneira, mas não tanto, nos protege”. A polêmica era a seguinte: os Estados Unidos queriam que houvesse um comando único da repressão à droga. O Brasil não quis. Queríamos ter nossa política. O fundo da questão é esse”.
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