sábado, 27 de abril de 2013

GENETON MORAES NETO



Ministro que comandou Planejamento nos “anos de chumbo” diz que tem dúvidas sobre se general Médici sabia ou não de tortura nos quarteis

sex, 26/04/13
por Geneton Moraes Neto |
categoria Entrevistas
O DOSSIÊ GLOBONEWS exibe neste sábado, às nove e cinco da noite (com reprise no domingo, às cinco e cinco da tarde), uma entrevista com um ex-ministro que durante nada menos de dez anos ocupou um gabinete no Palácio do Planalto, durante o regime militar. O economista Reis Velloso comandou a pasta do Planejamento nos governos Garrastazu Médici e Ernesto Geisel.
O mínimo que se pode dizer é que foi testemunha privilegiadíssima dos bastidores do poder nos chamados “anos de chumbo”.
Homem de confiança dos generais Médici e Geisel, o ex-ministro confessa que, até hoje, alimenta dúvidas sobre se Médici sabia ou não da existência de tortura. Diante dos ministros, o general disse que não sabia.
Intimamente, o homem que durante anos comandou o Planejamento não conseguiu chegar a uma conclusão.
Aos 81 anos, o ex-ministro diz que, desde o início, sabia que a construção da rodovia Transamazônica não daria certo. O projeto, grandioso, pretendia atrair para áreas despovoadas da Amazônia agricultores vindos de todas as partes do país.
Técnicos sabiam que a terra na Amazônia era imprópria para a agricultura. O problema é que, ao apresentar o projeto numa reunião ministerial, o general Garrastazu Médici já deu a construção da Transamazônica como fato consumado. Quem era contra o projeto tratou de engolir o sapo.
Os técnicos tinham razão : a Transamazônica deu no que deu.  
Um trecho da entrevista que a GLOBONEWS levará ao ar:
O senhor era ministro do Planejamento do governo Médici quando foi lançada a ideia da construção da rodovia Transamazônica, um projeto de grande repercussão. Alguém disse que aquilo poderia dar errado ?
Reis Velloso: “Não havia dúvidas: os solos da Amazônia não são apropriados para a agricultura. Mas havia m sonho – e cho que realmente era um sonho – de que aquilo iria produzir um grande efeito. Por isso, se construiu a Transamazônica. Numa reunião,  o presidente Médici apresentou como um fato consumado que a Transamazônica iria ser construída.  Já tinha sido convencido pelo Mário Andreazza ( ministro dos Transportes ) e por toda a área militar”
O governo Geisel praticamente abandonou o projeto da Transamazônica. O que é que o senhor, como ministro, dizia ao general Geisel sobre a rodovia ?
Reis Velloso: “Que não deveria ter sido feita ! Eu quase morri, aliás, na Transamazônica. Ainda no dia da inaguração, logo que terminou o almoço, eu e Andreazza fomos tomar um helicóptero para ir para Altamira. Como levantou muita poeira. Quando o helicóptero quis subir, o piloto, em lugar de continuar subindo, jogou o helicóptero contra um barranco. Eu disse para Andreazza: “Sai de cima de mim e te manda! Porque vamos morrer aqui dentro, carbonizados!”.  Nós saímos correndo. Quando olhamos para trás, o helicóptero explodiu. Eu já nçao gostava da ideia da Transamazônica. Depois dessa, fiquei gostando menos ainda. Eu disse : “Presidente,nós podemos perfeitamente esquecer da existência da Transamazônica. Vamos cuidar de outras coisas para a Amazônia. Eu, sinceramente, acho que o programa para a Amazônia até hoje não foi feito: estratégia para a região da Amazônia, como um todo, é aproveitar a biodiversidade – que é a maior do mundo”.     
A Trasamazônica terminou se transformando num grande motivo de propaganda para o governo militar. Qual foi a reação do presidente Geisel quando o senhor disse a ele que aquele projeto era inviável ?
“O presidente estava convencido de que realmente não fazia sentido, porque já tínhamos estudos de especialistas que mostravam não serem os solos da Amazônia próprios para a agricultura”.
O senhor diz, no depoimento ao Cpdoc da Fundação Getúlio Vargas, que,m durante um almoço, perguntou ao general Humberto de Souza Melo, comandante do II Exército, um homem da linha-dura, sobre tortura. Que resposta ele deu ao senhor ?
Reis Velloso: “Eu me sentei em frente a ele. Perguntei: “General, está havendo tortura ?”. Ele disse : “Não!”.  O general era linha-dura, comandante do II Exército. Numa reunião de ministério do governo Médici, o ministro das Relações Exteriores, Mário Gibson Barbosa, perguntou: “Presidente, está havendo tortura ? “. O presidente, na frente de todos os ministros, respondeu: “Não, não está havendo tortura”.
Isso significa que ou ele estava alheio e não foi verificar bem se estava havendo ou não tortura ou….. não sei. O certo é que ele, muito claramente, disse isso”.
Que interpretação o senhor dá ? O presidente Médici não sabia realmente da existência da tortura e o comandante do II Exército também não ? Os dois estavam mal informados ?
Reis Velloso: “É difícil acreditar que o comandante do II Exército não sabia. A explicação que ele me deu fazia sentido: disse que o “pessoal”, quando sabe que existe uma célula subversiva, comunista, não sei qual foi a expressão, já vai dizendo: “Larguem as armas ou serão mortos!”.  Isso ele me falou.
Mas não creio que fosse verdade….Eu acho que ele, realmente, ou não procurou verificar ou sabia e deixou que os porões funcionassem. Isso quanto ao general Humberto.
Quanto ao presidente Médici: tenho que pensar, porque há o seguinte : ele delegava demais. Eu sei bem na área econômica: tínhamos despachos com ele. Eu tinha uma vez por semana. Outros ministros de quinze em quinze dias. Mas a gente tratava dos assuntos era com o chefe do gabinete civil, Leitão de Abreu - que gostava de poder.
Eu me pergunto até hoje qual era realmente a causa de o presidente Médici ter dado aquela resposta ao ministro Gibson numa reunião ministerial” ( Reis Velloso se refere ao dia em que, ao responder a uma pergunta específica do ministro das Relações Exteriores sobre o assunto, o presidente Médici disse aos ministros que não havia tortura ).
O senhor tem dúvidas então sobre se o presidente Médici sabia ou não da existência de tortura ?
Reis Velloso : “Tenho dúvidas, tenho dúvidas….”
O senhor – que sempre teve um perfil técnico – sentiu em algum momento desconforto por estar atuando num regime ditatorial ?
Reis Velloso : “Só quem não é inteligente é que não tem dúvidas sobre o que fez”.

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